O GRANDE DITADOR (Christina Elias, vídeo, 2023)
Fico muito feliz em ter o meu novo vídeo O grande ditador (2023) na mostra SPACE DANCE 2023 de curadoria do artista butô Tetsuro Fukuhara (Japão). Na última década, Fukuhara, além de viajar pelo mundo com a performance/instalação Space Dance, tem promovido o meu crescimento como artista, bem como o dos demais presentes na exposição, compartilhando seu conhecimento conosco e divulgando a nossa produção internacionalmente.
Conheci Fukuhara em Roma em 2013, quando participei da sua oficina no estúdio Duncan. Desde então, tenho treinado meu corpo-mente para ser criativo com base em seu método de movimento construído em seis fases: "Fundação”, “Affordance”, “Começo da energia” ou “Nascimento dos pés”, “Criação da postura”, “Catarse” e “Fim”.
Embora todo esse caminho mereça atenção, neste breve post vou atentar para a noção de affordance na prática de Fukuhara. Em “Affordance”, procura-se perceber o corpo como objeto e não como sujeito. O corpo é sentido como um espaço de ossos (bone space). Uma vez detectado esse espaço de ossos, passa-se à exploração das possíveis relações deste espaço com outros objetos, outras pessoas ou outros espaços. Fukuhara emprestou o termo affordance da teoria de James Gibson em The senses perceived as perceptual systems (1966) e em The ecological approach to visual perception (1979). Segundo essa teoria, que, por sua vez, parte da Gestalt, a percepção do mundo não se dá apenas em termos de formas de objetos e relações espaciais, mas também pela percepção das possibilidades de ação que os objetos nos oferecem. Segundo Gibson, a percepção do ambiente necessariamente leva a alguma forma de ação. Affordances são pistas que os objetos nos oferecem de possíveis usos que podemos fazer deles. Essas pistas são interpretadas imediata e diretamente sem processamento sensorial.
Em Fukuhara, pensando-se no conceito próprio de affordance, pode-se dizer que o corpo, sentido como objeto pelo “usuário” ou performer/artista, tem a qualidade de permitir ao mesmo intuir o seu uso. Trata-se do estabelecimento de relações interdependentes, e não de movimento resultante dos nossos próprios esforços. Para treinar essa forma de percepção, Fukuhara faz recurso ao espaço construído (paredes, chão, pilastras, janelas, portas...), ao corpo do outro, bem como, e principalmente, ao próprio corpo. São constantes as indicações para que se provoquem, com o uso de objetos, sensações “estranhas” no corpo: caminhar e dançar com uma bota calçada apenas em um dos pés, o outro descalço; calçar mal os sapatos de forma que eles fiquem saindo dos pés; prender um dos braços na manga da camiseta etc. Trata-se de procurar aquilo que atrapalha o hábito.
A compreensão e incorporação dessa noção de affordance influencia estruturalmente o meu processo criativo marcado por um fluxo constante entre corpo e objeto.
Para ver a versão integral do vídeo O grande ditador (2023) bem como trabalhos de outros artistas que trabalham a partir do método de Fukuhara, favor acessar:
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